De: Ysolda Cabral
Nossa Senhora da Conceição é a padroeira do Recife. Portanto, hoje é feriado nesta capital. Estou entre as tarefas domésticas e algumas recordações. Devo antes de qualquer narrativa observar que, sou filha de mãe católica e pai evangélico, resultando na crença inabalável em Deus e na Virgem Maria.
Com Ele sempre converso e muitas vezes “arengo” e em qualquer lugar que eu esteja. É como se tomasse satisfação pelas merecidas “cajadadas” que a vida me dá e na hora sempre acho injustas e fico muito brava. Já com Ela, a coisa é diferente...
Com Ele brigo e a Ela peço proteção.
Como a influência materna sempre é mais assimilada, me batizei e casei na Igreja Católica. Contudo, muito esporadicamente vou a Igreja e não necessariamente à missa. Entretanto, nesta época do ano, gosto de subir ao morro da Nossa Senhora da Conceição, localizado no bairro de Casa Amarela e lá, no alto do morro, pertinho do céu, conversar um pouco com Ela.
Muito bem; há uns dez anos atrás, no finalzinho de uma tarde de domingo, de volta de uma dessas “conversas”, ao cruzar um semáforo atropelei um banhista o qual retornava da praia em sua bicicleta. Imediatamente parei para socorrê-lo. Uma multidão se formou do nada e eu fiquei totalmente desorientada.
Do meio da multidão surgiu um rapaz descalço apenas de bermuda, de aspecto sujo e feio. Chegou junto de mim e falou para que eu tivesse calma. A maneira como falou me surtiu um efeito imediato.
Foi até o atropelado, o ajudou a sentar-se. Depois, foi até meu carro, abriu a porta do lado do passageiro, retirou do banco detrás o guidon da bicicleta e os vidros do pára-brisa. Em seguida, ajudou o rapaz a se levantar, entrar no carro e mandou que eu também entrasse. Pegasse o volante e rumasse para o hospital mais próximo me mostrando, inclusive, o caminho.
Chegando ao hospital, imediatamente, ele foi atendido e, constatado pelo médico de plantão, que o acidentado estava alcoolizado e do acidente, com poucas escoriações. Iria permanecer em observação por algumas horas e depois seria liberado.
Respirando aliviada, porém ainda um tanto transtornada, me dirigi ao posto policial do próprio hospital para registrar a ocorrência. Neste momento chegou, também de bicicleta, o cunhado dele o qual trazia pela mão uma garotinha de três anos. Contou para todos que, não havia como ter sido evitado o acidente visto que, seu cunhado estava bêbedo e com raiva por ele não ter permitido que trouxesse a filha – a garota que trazia pela mão - na garupa da bicicleta e havia cruzado o sinal sem olhar.
Eu, ainda quis permanecer no hospital, mas ele me disse para ir embora, pois a partir daí tomaria as providências.
Senti em meu braço a mão do meu “ajudante”, a me conduzir de volta ao carro. Perguntei-lhe onde morava e ele me disse para não me preocupar e que só sairia de junto de mim quando eu estivesse em casa. No trajeto, encontramos a polícia rodoviária, a qual já sabia do ocorrido e nos parou para saber se eu estava em condições de dirigir e me parabenizar pela correção de minha atitude.
Ao chegar em casa, olhando o grande estrago no meu carro, agradeci a Ela, Nossa Senhora da Conceição, pela vida do banhista e pedi ao meu esposo para levar o rapaz que me ajudara, à sua residência.
Meu esposo olhando para mim perguntou: que rapaz?
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Publicada também no Recanto das Letras.